segunda-feira, 31 de agosto de 2009

Excertos. Internacional Situacionista - Antologia... (em actualização)


"As Máquinas Idílicas
Em Maio de 1962 foi difundida a imagem dum protótipo americano que serve para transcrever directamente as palavras num teclado de máquina de escrever. A human touch da publicidade desta invenção reside naturalmente na felicidade da secretária: doravante basta-lhe olhar para a máquina a escrever sozinha. Sem examinarmos aqui as reais incidências económicas desta modernização do trabalho das secretárias, convém notarmos a que ponto semelhante imagem traduz um sonho básico da sociedade actual (os devaneios dominantes duma época são os devaneios da classe dominante). É a expectativa de um momento da evolução social em que a contemplação passiva das máquinas da produção passaria a articular-se, sem ruptura sensível, com a contemplação passiva das máquinas do consumo. Num nirvana tecnicizado do puro consumo passivo do tempo, tudo o que haveria a fazer consistiria em ver fazer; e sendo este 'fazer' apenas o das máquinas, seria para sempre o dos proprietários de máquinas (apagando-se cada vez mais a propriedade júridica - direito de usar e abusar - em proveito do poder dos programadores competentes e paternais)."

-------------------------------------------------------------------------------------------------

"(...) a força desta sociedade, o seu temível génio automático, pode avaliar-se neste caso extremo: se um belo dia ela brutalmente declarasse impor uma existência de tal modo vazia e desesperadora que a melhor solução seria as pessoas enforcarem-se, ainda assim conseguiria abrir um negócio salutar e rentável com base na produção de cordas uniformizadas."

terça-feira, 18 de agosto de 2009

JCJC

poizé...


“(…) A maneira de uma pessoa se debruçar sobre o povo, em busca dum longínquo primitivismo do quotidiano, e sobretudo esta satisfação confessada sem rodeios, este orgulho ingénuo de fazer parte duma cultura cuja estrepitosa falência e radical incapacidade de compreender o mundo que a produz ninguém pode pensar em dissimular, são coisas que não deixam de ser espantosas. Há nisto a vontade manifesta de se abrigarem por detrás de uma formação do pensamento que se baseou na separação de domínios parcelares artificiais, com vista a rejeitarem o conceito inútil, invulgar e incómodo, de «vida quotidiana». Semelhante conceito cinge um resíduo da realidade catalogada e classificada, resíduo este com que alguns repugnam-se ver-se confrontados, porque ele é ao mesmo tempo o ponto de vista da totalidade, implicando por isso a necessidade de uma avaliação global, duma política. Dir-se-ia que certos intelectuais se gabam assim duma participação pessoal ilusória no sector dominante da sociedade, por terem uma ou duas especializações culturais; coisa, no entanto, que os coloca na primeira fila para perceberem que o conjunto desta cultura dominante está notoriamente roído pela traça. Seja porém qual for a avaliação que se faça da coerência desta cultura, ou do seu interesse, visto em pormenor, a alienação que ela impôs aos intelectuais em questão consiste em levá-los a pensar, a partir do céu dos sociólogos, que eles, intelectuais, são totalmente exteriores à vida quotidiana das populações vulgares ou se encontram muito acima na escala dos poderes humanos, como se não fossem, também eles, uns pobres.(…)”


Guy Debord

Excerto de um texto transmitido em gravação, a 17 de Maio de 1961, no Grupo de Investigação sobre a Vida Quotidiana, organizado por Henri Lefevre no Centro de Estudos Sociológicos do C.N.R.S. Reproduzido na I.S. nº 6, Agosto de 1961

domingo, 9 de agosto de 2009